sexta-feira, 1 de julho de 2011



INVERNO, A ESTAÇÃO DO AMOR PARA MARIA RITA E KAKÁ



Manhã de Inverno

Coroada de névoas, surge a aurora
Por detrás das montanhas do oriente;
Vê-se um resto de sono e de preguiça,
Nos olhos da fantástica indolente.


O inverno chegou. Com seus dias mais curtos, noites mais longas, frio e geada ao amanhecer, faz com que a natureza se mostre num novo cenário, e as pessoas também.

Por trás da janela embasada é possível sentir o vento gélido soprando por entre as árvores sem folhas ao redor.

Neste ano chegou mais cedo, no início de junho, passou literalmente a perna no outono. No novo cenário, o desfile fashion de roupas grossas e coloridas transforma as ruas em passarela. Cada um se agasalha como pode: pesados casacos, malhas, luvas, gorros, cachecóis enrolados ao redor do pescoço. Vale tudo na luta contra o frio, até caminhar com passos mais acelerados na tentativa de espantá-lo ou ir ao encontro dos tímidos raios de sol, que insistem em aparecer, em tons e nuances especiais, para com seu toque acolher e aquecer.


Névoas enchem de um lado e de outro os morros
Tristes como sinceras sepulturas,
Essas que têm por simples ornamento
Puras capelas, lágrimas mais puras.


Dizem, não sei, que Maria Rita detesta essa estação. Já o Kaká, adora o frio. Fazer o quê, esse parece ser o relacionamento mais bipolar sobre a face da Terra.

Para ela, representa o frio penetrando nos ossos, pés gelados apesar das meias grossas, nariz congelado, vento e umidade teimando em entrar por frestas de janelas e portas, além daquela vontade incontida de só acordar ao meio-dia. Sete graus positivos ao amanhecer e a sensação de hipotermia crônica ao tentar sair da cama. É assim que define os dias de inverno.

Para ele, o frio tem um quê de encanto e magia. A neblina fria da manhã, antes do sol nascer, é um presente que ilumina os olhos de qualquer fotógrafo; durante o dia, então, o céu vai ficando mais azul, emoldurando a cidade com seus matizes. Os crepúsculos amarelados e avermelhados têm o poder de liberar emoções, fontes de inspiração para as lentes das camêras e de todo aquele que tenha alma de artista.


A custo rompe o sol; a custo invade
O espaço todo branco; e a luz brilhante
Fulge através do espesso nevoeiro,
Como através de um véu fulge o diamante.


Maria Rita está convicta de que o inverno faz aflorar o meteorologista que dormita em cada um de nós. Basta a onda de frio chegar para o assunto ser um só: o tempo. No elevador, do décimo primeiro andar ao térreo todos palpitam sobre a chegada da frente fria, geada, queda brusca da temperatura,.... É quando relógio e termômetro se fundem para marcar 7 horas e 9 graus da manhã. A vontade de chegar em casa é grande nesses dias, e a de ficar morgando debaixo do edredom maior ainda. Programas noturnos como idas a barzinhos ou restaurantes, só se forem importantes ou inadiáveis.

Os invernos do Kaká, por sua vez, são pura magia, um convite para sonhar e vivenciar o amor em toda a sua plenitude. A época propícia para casais apaixonados ficarem juntos e abraçados à luz de velas, brindar com taças de vinho num jantar romântico, e se possível, diante do fogo de uma lareira para o aconchego dos amantes. Dias perfeitos para ir à delicatessen tomar um delicioso chocolate quente, sair de casa e ficar agarradinho com quem se gosta no cinema ou teatro. Sem dúvida, a estação do amor, muito mais que a primaveril Primavera. No inverno há algo de romântico e afrodisíaco no ar, onde o amor aquece o coração, costuma dizer.


Vento frio, mas brando, agita as folhas
Das laranjeiras úmidas da chuva;
Erma de flores, curva a planta o colo,
E o chão recebe o pranto da viúva.


Necessito de calor, afinal sou nascida nos trópicos! queixa-se Maria Rita, enquanto esfrega as mãos. Os pássaros e as árvores também sentem falta dos raios do sol, diz ao contemplar os galhos despidos de folhas que aos poucos foram amarelando e caindo. Pra que serve tanto frio? pergunta ao vento.

Kaká acredita que nos dia frios a alma muda e o calor humano acontece. Um abraço aconchegante pode ser mais contundente que palavras; o silêncio que o frio traz, pode ser mais profundo e audível que o próprio som. Basta olhar para a natureza, os galhos vazios à espera da floração, é como se o inverno cobrisse a Terra com a neblina e o vento frio para que seu interior possa adormecer e descansar, e assim poder retornar com mais força e viço.


Gelo não cobre o dorso das montanhas,
Nem enche as folhas trêmulas a neve;
Galhardo moço, o inverno deste clima
Na verde palma a sua história escreve.


Maria Rita não espera a resposta do vento, para ela o frio só tem serventia para aqueles que defendem a tese de que o frio é psicológico. Tem maior asneira que essa? Só se forem monges tibetanos! E tem mais. Seu carro, que é movido a álcool, é tal qual a dona, também não convive bem com o inverno, se recusa a pegar nas manhãs frias, e o que é pior, quase sempre quando o tanquinho de gasolina está no osso. É a época em que ela se torna assídua usuária do metrô. Bom, ao menos está dando a sua contribuição para o meio ambiente e congestionamentos de São Paulo deixando de colocar mais um carro na rua, costuma dizer resignada.

Kaká tem o hábito de caminhar pela manhã no Parque do Ibirapuera. Nos dias frios não é diferente. Já se encontra lá quando a passarinhada começa a voar por todos os lados, dando vida à paisagem gelada ao redor do lago, alegrando o dia dos frequentadores com seus gorjeios e trinados em várias vozes e tons. Uma verdadeira sinfonia ao ar livre, à disposição de todos.


Pouco a pouco, dissipam-se no espaço
As névoas da manhã; já pelos montes
Vão subindo as que encheram todo o vale;
Já se vão descobrindo os horizontes.


Hoje, o sol começa a levantar com disposição, desfazendo a bruma da manhã, mostrando o céu azul anil, completamente límpido, prenúncio de um dia maravilhoso, com temperatura suportável e amena. Kaká não perde tempo, vai ao encontro de Maria Rita contar a boa nova. Aproveitando as costumeiras férias dela no mês de julho, fez reservas para passarem uma semana em Bariloche.

Kaká só pode estar de brincadeira! Com tanto lugar pra ir acima da linha do Equador, foi escolher justo uma das cidades mais frias nesta época do ano! Desnecessário é dizer, que em vão foram os argumentos de que a viagem estaria fadada ao fracasso com atrasos e contratempos no aeroporto de Cumbica por conta das cinzas do vulcão no Chile. Por fim e diante do entusiasmo do sempre surpreendente Kaká, acabou aceitando o inesperado convite e se conformando. Uma semana de frio intenso não mata ninguém, repetia para si mesma, além do mais o cobertor de orelhas vai junto e sempre é possível ficar ao redor de uma lareira acesa, vestir roupas quentes, em especial, os estonteantes casacos, couros e malhas vendidos por lá. Assim é que examinados todos os argumentos a favor, resolveu aventurar-se.


Sobe de todo o pano; eis aparece
Da natureza o esplêndido cenário;
Tudo ali preparou co’os sábios olhos
A suprema ciência do empresário.

(poema de Machado de Assis)

Foi com os dedos tiritantes que fez o post para o CANDINHA, comentando os passeios daqueles dias e descobrindo que escrever também aquece a alma e o corpo:

Passei dias inesquecíveis em Bariloche ao lado do Kaká. A cidade tem, entre seus bens imperecíveis, uma das mais míticas estações ferroviárias do mundo, a velha e desativada estação que anunciava a entrada na “verdadeira Patagônia”, agora transformada num dos mais belos restaurantes da região, o Hasta que Llegue el Tren.

Para não falar de comida, numa região onde a grande especialidade é o cordeiro andino ou patagônico, já que, nessa época, o inverno tem o péssimo hábito de querer engordar as pessoas, é como se a Mãe Natureza quissesse ver todos fofos, bem nutridos e gordinhos, rrrrr, sendo assim, falarei do amanhecer na cidade.

Ao longo do lago, da varanda do chalé onde ficamos, era possível ver pequenos hotéis e casas com flores no peitoril, mais ao centro, ruas arborizadas, lojas apetecíveis com cafés e chocolaterias (pulando essa parte, prometi não falar em comida), e uma preciosa paisagem com ar ligeiramente europeu, suíço, alemão, nórdico. Kaká não perdeu tempo e registrou cada reduto com a sua máquina.

Um dia para nunca esquecer foi o passeio de catamaran pelo Nahuel Huapi, lago majestoso, profundo e limpo que rodeia Bariloche e vai quase até ao coração dos Andes e a fronteira com o Chile. Em sua água abrem-se sulcos refletindo a luz entre canyons que parecem descer do céu. O caminho é belíssimo. Para Kaká um presente divino em forma de cores nos seus mais variados tons e matizes: verdes diluídos, amarelos outonais tingidos de violeta, azuis brilhantes. Em meio a isso, o ruído magnífico do silêncio que lembra filmes, aventuras, viagens pelo in­terior da terra, entre pássaros desconhecidos.

Como diz o Kaká, há uma terra que ronda os Andes, com seus lagos e picos brancos, céu deslumbrante e limpo, onde a tranquilidade da paisagem atravessa os caminhos que lembram a solidão das montanhas, experiência para todos os sentidos.

Vocês estarão perguntando:
E o frio? Nem senti. Tinha um cobertor de orelhas sempre ao meu lado, rsss.

Abaixo o fundo musical das florestas no inverno; ouçam e se prestarem atenção poderão sentir um ventinho frio batendo no rosto....






E você na estação do inverno, está mais para Maria Rita ou Kaká?

Não sou a Maria Rita, mas como ela também estou tirando uns dias de férias. Volto em agosto com novos temas, histórias e para o aniversário de dois anos do Cantinho. Aproveitem os dias frios para enroscar-se num cobertor (de orelhas ou não), tomar chocolate quente com churros (hummm), saborear um delicioso e fumegante caldo verde, ou, um fondue de queijo para reunir os amigos, e, encher um cálice de vinho tinto à luz de velas ou não, sem esquecer - no entanto - de aquecer a alma.

Até a volta!

Kisses, Shadow



Licença Creative CommonsA obra INVERNO, A ESTAÇÃO DO AMOR DE MARIA RITA E KAKÁ de MARIASUN foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição - Uso Não Comercial - Obras Derivadas Proibidas 3.0 Não Adaptada.



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