sexta-feira, 20 de agosto de 2010


DOMINGO NA 8Oa. FESTA DA ACHIROPITA





Pode-se dizer que, desde o final da Copa do Mundo, Leninha tem andado em estado de graça. Corre a boca pequena que é por causa do Tavinho, filho do Seu Tião, que - coincidentemente - tem vindo com mais frequência de Piracicaba para passar os finais de semana no Bixiga.


Quando ele não está por lá, é comum vê-la na janela do quarto com aquele ar abobalhado, de quem está com o pensamento longe, muito longe. Para aqueles que se atrevem a interromper esse momento de introspecção e encantamento, perguntando se ela viu o passarinho verde, responde que está admirando as bandeirinhas que enfeitam a vila.

As bandeirinhas e fitas verdes e vermelhas não são resquício da Copa não, são um sinal de que o Bairro está em Festa. Aliás, ô gente festeira aquela que mora por lá!!


As tais bandeirolas chegam até a Rua Treze de Maio, alegrando a todos que passam a pé ou de carro. Aos finais de semana barracas enfeitadas parecem surgir do asfalto, são em torno de trinta, numa quermesse a la italiana em pleno mês de agosto, que ao invés de comidas típicas de Festa Junina, oferece culinária italiana.

A Festa de Nossa Senhora da Achiropita acontece no Bixiga desde 1926, e foi criada pela comunidade italiana para arrecadar fundos a fim de transformar sua Capela em uma Igreja. Hoje, faz parte das tradições da cidade.

Foi nesse ambiente que Leninha e a Val, sua irmã, cresceram, cercadas de muita Tarantela, fogazza, pizza, macarronada, fazendo parte de uma família que em pouco tempo soube incorporar os hábitos e o espírito alegre da vizinhança.


Ao ver aquela vila hoje em festa, impossível não lembrar de sua meninice, de quando ela com sua saia vermelha rodada, camisa branca e lencinho verde na cabeça, ficava dançando e correndo entre as barracas, de um lado pro outro, com as outras crianças.

A Festa era sempre precedida de uma Missa solene com
a presença da homenageada, a Nossa Senhora da Achiropita, que em procissão pelas ruas do Bairro, parecia convidar a todos para participarem do grande acontecimento mais tarde. Tal como ocorreu no último dia 15, dia do Aniversário da Santa.

Durante o evento, tudo acontecia por lá, pessoas se conheciam, encontros eram marcados, fofocas surgiam,...aliás, foi em uma dessas ocasiões e enquanto uma sanfona tocava “Funiculí, Funiculá”, que ela beijou pela primeira vez um menino, o Betinho, filho do Seu Nicola. Uau!! Ficou semanas pensando nele, com aquele ar abestalhado de quem viu o passarinho verde!! Dna. Rosa não parava de dizer: “Acorda menina! Parece que está sempre no mundo da Lua!!”. Por um certo período ela esteve sim.

Agora parece ter voltado pra lá (pro mundo da Lua).


E não é que por conta disso se ofereceu pra ajudar a Dna. Concheta, mãe do Tavinho, na barraca de fogazza da Festa? Como assim? É público e notório que a Leninha mal sabe fritar um ovo! Se tem alguém que passa longe da cozinha, é ela.


Muito embora, os voluntários da Festa passem por um treinamento meses antes, diante do entusiasmo da moça e do pedido del suo bambino, Dna. Concheta deu um jetinho (a la brasiliana) de encaixar a Leninha.

Foi assim, que ela embarcou nessa maratona, no último domingo, ao lado das “mammas”. Por ser jovem e novata, deixaram-na cuidar da massa da fogazza, ou melhor, socar a massa até deixá-la no ponto. “Il segreto di una buona massa, consiste em mexer a massa para tirar as bolinhas de ar, para que ela fica perfeita e lisinha. Capito!”, disse Dna. Concheta, “Si, capito!” , respondeu prontamente.

Parece barbada para as pessoas normais...mas, não é fácil, é preciso habilidade, coordenação motora e paciência, aptidões que a prestativa Leninha, definitivamente não tem.


Não fosse Dna. Giovanna, a barraca da fogazza teria sido um completo fiasco. Como as tais bolinhas de ar pareciam se multiplicar na massa, Lena passou a colocar um pouco de farinha, enquanto sovava, mexia, amassava e socava (orientação da própria Dna. Concheta, um pizzico de farina aiuta sempre). Como elas (as tais bolinhas de ar), teimosas, permaneciam ali, para apressar o processo, passou a despejar o ingrediente aos quilos, enfarinhando a touca, o avental, o rosto, os olhos, a mesa, o chão, as pessoas ao seu redor...a massa ficou mais dura é certo, mas as bolinhas de ar....Travava essa luta insana, quando Tavinho apareceu. Ele custou a acreditar no que via, surreal demais! “Precisa de ajuda?”, falou, mal contendo o riso. “Não, essas luvas é que estão me atrapalhando um pouco”, disse meio sem graça, tentando disfarçar sua total falta de jeito.

Foi então que Dna. Giovanna entrou em ação. A pretexto de que a barraca precisava de mais pessoas para atender ao público, Leninha foi transferida de função, isto quando um apetitoso aroma de comida se espalhava pelo ar, e uma incontrolável vontade de comer ou beliscar, aumentava. Mas, como esquecer um dos mandamentos de Dna. Concheta: Non mangiare ciò che viene servito.“Ah, um espaguete ao sugo agora!...Onde é que eu fui me meter!”, pensava.

Agora alguém responda: Lena com fome, respirando farinha, cansada já na primeira hora, seria capaz de ser uma boa atendente? Ser simpática e cordial, seria mais do que suficiente?

Bom ela é um doce de pessoa, disso ninguém duvida, mas, com a fila da fogazza dando a volta no quarteirão, todos querendo fazer o seu pedido ao mesmo tempo, no maior empurra-empurra, talvez fosse exigir demais! “Calma, tem pra todos. Vamos pela ordem. Quem chegou primeiro?”. Uns oito gritaram a uma só vez. “Vocês querem fazer uma fila, per favore?” (ô gente esfomeada!, dizia pra si). Nesse momento, Dna. Concheta deixou a Genoveva cuidando do recheio, e veio em seu socorro.

A noite parecia serenar, quando chegou um grupo de seis pessoas. “Queremos seis fogazzas.”, “Com que recheio?”; “Tem do que?”, “Está escrito aí, bem na sua frente!” (povo que tem preguiça de ler ou é cego, pensou); “Ah, é mesmo!”, decorrido algum tempo, com mais gente esperando pra ser atendida,
e já tamborilando a caneta no bloquinho de pedidos, tornou a perguntar secamente ao indeciso grupo: “E então, vão querer do quê?”, “Ai, calminha, ainda estamos pensando”, não fosse a Dna. Concheta de novo...

Nem é preciso dizer que mais de uma vez precisou recorrer à Santa, “Daí-me forças!”

É, Nossa Senhora da Achiropita não desampara ninguém! Leninha alcançou sua Graça, pois conseguiu sobreviver àquelas seis horas em pé. Quem diria? Exausta, com as pernas latejando e dormentes, estômago vazio, mas, apesar disso, quando a barraca foi fechada, sentia-se leve, invadida por uma enorme satisfação e sensação de missão cumprida. Foi mágico e emocionante quando todos os voluntários se juntaram, deram as mãos e agradeceram, inclusive, o Tavinho que ficou animando a Festa com muita música italiana. Todos estavam radiantes e felizes, apesar do cansaço.

Abraçada com ele, seguiu em silêncio para casa, naquela noite extremamente fria em São Paulo. Quem prestasse atenção, poderia ouvir uma pequena melodia ao fundo
, vindo daqueles dois corações... Con te Partiró...






Shadow



A 8Oa. Festa Nossa Senhora da Achiropita acontece nas Ruas do Bairro do Bixiga (Treze de Maio, São Vicente e Dr. Luiz Barreto), em São Paulo, aos sábados das 18 às 24h e domingos das 17:30 às 22:30h. Começou no dia 31 de julho e vai até 29 de agosto, apenas aos sábados e domingos. Os visitantes, além dos deliciosos pratos, podem também visitar o altar da Nossa Senhora da Achiropita.



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