sábado, 8 de maio de 2010



DIÁRIO DE MÃE




Lá estava Bia com as pequeninas mãos estendida, segurando cheia de orgulho um cartão cor de rosa. Com delicadeza Valquíria pegou o lindo presente e o abriu. Nele, em letras que pareciam ter sido bordadas, estava escrito: “Mamãe eu te Amo”.


Mal pode se conter nesse momento, aproximou-a para perto de si e deu-lhe um abraço cheio de emoção, ao mesmo tempo que o passado lhe trazia o abraço que um dia recebera de Dna. Rosa, sua mãe, por conta de um cartãozinho com a mesma frase.

Quanta saudade!

Somente com o passar do tempo, Valquíria fora capaz de entender melhor sua mãe, e agora se perguntava, Bia seria capaz de entendê-la?

Quando é que o desencontro entre mãe e filho começa?


Com ela começou aos 8 anos, no dia em que pediu a Dna. Rosa para que não a levasse mais até a porta da escola, tinha vergonha de ser vista com ela, não queria pagar mico na frente dos outros. Achava-se crescida e forte o suficiente para enfrentar o mundo com as próprias pernas. Ainda lembra, no entanto, do alívio que sentiu algum tempo depois, ao olhar para trás e ver sua mãe parada na esquina, acompanhando-a à distância como um anjo protetor a guiar-lhe os passos.

E o desacerto das duas quando tinha 15 anos? Naquela época os conflitos foram inevitáveis. Julgava que sua mãe fazia de tudo para ferrá-la e contrariá-la, parecia não ver que os tempos
haviam mudado, era totalmente incapaz de entender e atender as suas vontades, coisa de outra geração. Todas suas amigas iam pra balada, namoravam, e ela ficava regulando, por quê? Será que era tão difícil perceber, que não a queria impondo regras ou limites, ou que a impedisse de viver novas experiências? Porém, uma coisa é certa, jamais esqueceu do quanto foi importante no dia em que voltou aos prantos pra casa, por conta da primeira desilusão no amor, amparando-a e acariciando-lhe os cabelos, ao mesmo que tempo que lhe dizia com ternura: “Você será muito amada um dia!”, foi assim que ela a curou. Isso sem contar as vezes, em que impediu que levasse um vergonhoso castigo do pai, por ter chegado mais tarde do que o combinado.

Aos 18 anos, acreditou que seria a ruptura definitiva, o derradeiro corte do cordão umbilical com Dna. Rosa. Valquíria saiu de São Paulo, foi fazer Medicina Veterinária em Piracicaba, alugou um kitinete, pensando ter deixado para trás todo o seu passado. Agora sim, seria dona do seu próprio nariz! Não mais teria que ouvir as opiniões, palpites e conselhos da mãe, ou ver aquele olhar que falava mais do que as palavras. Que bobagem! No primeiro feriado prolongado, voltou para a casa materna carente de afeto, do ombro amigo, ansiosa por reencontrar o único reduto onde sentia proteção, compreensão e paz.

Apesar disso, houve um momento em que Valquíria de fato se deu conta de que trilhava um
caminho sem volta, uma forte sensação de independência, de estar livre das amarras da mãe se apossou dela. Foi aos 28 anos, quando casou e saiu em definitivo da casa de sua infância, para constituir sua própria família. Não obstante, Dna. Rosa preservou ao longo dos anos o quarto que fora dela com tudo que o guarnecia, como num tributo àquela menina que ali crescera, e que fora a razão do seu viver.

Mas, bastou a Bia nascer, para que aquele ser mutante, se tornasse mais forte e vigoroso, além de mãe, agora era também avó. Valha me Deus! Valquíria começava a entender o significado daquilo que as pessoas querem dizer quando afirmam que avó, é ser mãe em dose dupla.

E assim a vida foi seguindo. O tempo foi inexoravelmente aumentando a distância de Valquíria com a sua mãe, mesmo que de vez em quando Dna. Rosa aparecesse, como que pra ter certeza de que tudo estava bem. Apesar dos cabelos cada vez mais grisalhos, ela pouco mudara, continuava a ser aquela mulher admirável sábia, amiga, conselheira, anjo da guarda, papéis que lhe cabiam tão bem e que somente ela poderia protagonizar.
Valquíria achava que seria assim pra sempre, mas o final dessa história foi ela quem escreveu. Sem mandar aviso ou recado, resolveu partir. Assim, sem mais nem menos, sem data marcada, sem um último abraço.

Ela simplesmente se foi. Deixando uma imensa saudade.
 
Passado algum tempo, ela retornou à casa materna para separar alguns objetos. Foi quando encontrou escondida no fundo do armário uma caixa meio envelhecida pelo tempo, com marcas amareladas como a indicar que fora aberta e manuseada muitas e muitas vezes. Ao abrí-la, qual não foi a sua surpresa, ao ver espalhados em seu interior os vários cartões e presentinhos que havia feito e dado a Dna. Rosa por ocasião do Dia das Mães, Natal,...Todos ali guardados, ao longo dos anos, com imenso carinho, como preciosos tesouros, dentre os quais aquele primeiro cartão cor de rosa, escrito com tanta dificuldade, quando ainda estava sendo alfabetizada: “Mamãe eu te amo”.


E no terno abraço trocado agora com a Bia, teve a estranha sensação de estar sendo abraçada também por Dna. Rosa, nesse momento, uma lágrima rolou em seu rosto ao lembrar de sua mãe.


“Em geral, as mães, mais que amar os filhos, amam-se nos filhos”. Friedrich Nietzsche



A todas as Amigas deste Cantinho,
aquela que é mãe,
aquela que pretende ser mãe,
aquela que tem sua mãe ao lado ou no coração,

UM FELIZ DIA DAS MÃES!!!



Shadow/Mariasun



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