Uma lenda indígena conta que antes do rio São
Francisco ser formado, várias tribos viviam no chapadão da bacia. Em uma dessas
tribos vivia uma índia chamada Irati, apaixonada por um bravo guerreiro de outra
tribo. Esse amor foi interrompido quando ele teve que ir para a guerra e não mais
voltou, restando apenas um grande sulco aberto na terra pelos passos por onde o jovem
guerreiro passou. Dominada pela imensa saudade, Irati chorou
incansavelmente a ausência do amado e, desse seu pranto, lágrimas começaram a
escorrer pelo chapadão, despencando do alto da serra formando uma cascata; as
águas da cascata caíram sobre o sulco por onde o índio passara, nascendo assim
Opará, na língua indígena, rio-mar, o rio São Francisco, correndo do sudeste rumo ao norte e para
o mar.
Ainda hoje, as águas do rio carregam em sua correnteza lendas e tradições....
Há milênios, a água é o símbolo maior da vida e do sagrado. Ela contorna obstáculos, esculpe as pedras dos rios, mostra-se serena nos lagos, intensa nas cachoeiras, abençoada nas chuvas. Está sempre em movimento...
Ainda hoje, as águas do rio carregam em sua correnteza lendas e tradições....
Há milênios, a água é o símbolo maior da vida e do sagrado. Ela contorna obstáculos, esculpe as pedras dos rios, mostra-se serena nos lagos, intensa nas cachoeiras, abençoada nas chuvas. Está sempre em movimento...
A água, por si só, tem uma mística própria, ela é para a natureza como o
sangue é para o nosso corpo, levando vida, irrigando a terra, fazendo crescer as
plantas, saciando a sede. Em várias religiões e tradições a água simboliza o sagrado, o divino.
Nas Escrituras Sagradas, encontramos várias passagens falando da água: Jesus sendo batizado nas águas do Rio Jordão, como símbolo da vida nova e da purificação dos pecados; Moisés com o seu cajado abrindo as águas do Mar Vermelho para seguir com seu povo rumo à Terra Prometida....
Nas religiões afro-brasileiras, encontramos os orixás em perfeita harmonia com as águas e a natureza. Muitos dos seus rituais são realizados em cachoeiras, rios e mares.... Assim como, as comunidades ribeirinhas por onde o velho Chico passa, ricas, quando o assunto é cultura, tradição e lendas, tendo o rio como seu principal protagonista.
Quais são os mistérios das águas do rio São Francisco ao passar pelos capões esparsos entre os morros e as chapadas, pelo verde dos coqueiros e das palmeiras de buriti, e, o ecoar do grito das maritacas, que mexe com o nosso imaginário? Quais os segredos ocultos em suas margens e canions?
A verdade é que a natureza reluz nesse rio-mar em todo o seu esplendor, dominando com majestade o horizonte que lhe pertence. O caudaloso rio São Francisco tem uma beleza que impressiona, impõe respeito e uma espécie de veneração quase sagrada. É preciso ter cuidado para não se deixar hipnotizar, enredar e levar por suas correntes e redemoinhos.
Poucos lugares do mundo são tão identificados com a natureza quanto o velho Chico. Por que velho? Justamente por guardar a ancestralidade que corre em suas águas. Os índios dizem que não se deve entrar em suas margens ou em suas águas sem pedir licença aos pajés. A água do velho Chico é sagrada.
Nesta semana, no leito do rio São Francisco, lágrimas de todo um país se juntaram às de Irati.
Foi com estarrecimento que ficamos sabendo da morte por afogamento em suas águas, do carismático e talentoso ator Domingos Montagner, a duas semanas do último capítulo da novela, onde o velho Chico também é um dos protagonistas. Uma triste ironia!!!
A ficção e a realidade, a realidade e a ficção....
A novela escrita por Benedito Ruy Barbosa feita em homenagem ao rio São Francisco, num cenário que retrata a escassez da água, poluição e a transposição de um dos rios mais importantes do Brasil. Uma história centrada no amor e no ódio, na vida e na morte, tendo como fio condutor a saga do destemido Santo dos Anjos, o personagem de Domingos Montagner, um herói que comovia e transpirava afeto, hoje imortalizado nas águas do São Francisco, rio que com ele contracenou do início ao fim.
Nunca o nome de um personagem coube tão bem em uma história: Santo dos Anjos. Santo nos remete aos ritos sagrados, à divindade, ao sagrado que o rio representa; dos Anjos, anjos são mensageiros espirituais entre Deus e os homens, com os quais Domingos Montagner deve estar confraternizando agora.
Seguindo esse entendimento, é preciso dizer que a novela navegou por águas turvas e perigosas ao lidar com o misterioso mundo dos mortos: o barco dos mortos; o matador que consulta o espírito do pai morto; as famílias em luta em nome dos mortos; a vidente indígena que prevê a morte de alguém e dá uma carranca para proteção; o morto que fica vagando entre os vivos, por não saber que morreu; o espírito de uma criança morta aprisionado por anos em um dos quartos da casa do coronel; a confecção da mortalha à espera da morte; o retrato na parede do pai morto; a matriarca que mergulha no rio para morrer, após pressentir a morte do neto; o corpo inerte sendo levado pelo rio para renascer após a morte, justamente Santo, o personagem de Domingos Montagner, uma das cenas mais impactantes da novela... e... a própria morte do rio, mencionada o tempo todo... tendo como música tema de Santo e Tereza "Mortal Loucura" de Maria Bethânia.
Em seus capítulos, a novela transitou pela religião com matriz africana e indígena. Os atores foram envolvidos nessa trama, sem serem iniciados e protegidos das energias e forças da natureza que envolvem mistérios densos e delicados. A cultura afro-indígena tem os seus mistérios e, muitos deles precisam ser dominados e tratados com o máximo respeito. Como bem sabem os índios: é preciso pedir permissão para entrar nos rios e nas matas... Eles têm seus donos....
Existe energia na natureza. Existe um poder. Existe uma força. Existe vida. A ficção se apropriou das águas do São Francisco, ao ponto de se tornarem um só, sem olhar para os perigos dessa proximidade.
Domingos Montagner foi o segundo ator a morrer durante a gravação da novela. O primeiro foi o não menos talentoso, Umberto Magnani, cujo personagem era um padre, um religioso, conhecedor dos mistérios da vida e da morte.
As vivencias dos índios e dos pescadores do rio São Francisco transcendem a atividade da pesca tocando o imaginário simbólico. A vida pulsa não apenas nos aspectos que envolvem a alimentação, a economia e o transporte da região, mas também a cultura local, com muitas lendas e histórias. Uma das histórias contadas pelos barranqueiros é a do "Vapor Encantado", transportado para a novela “Velho Chico” como a "Gaiola Encantada", o barco dos mortos.
A embarcação teria sido avistada pela primeira vez por dois canoeiros. Eles estariam atravessando o rio quando se depararam com um barco a vapor muito iluminado navegando ao longe. Ao se aproximarem, o barco simplesmente desapareceu diante deles.
Essa lenda segue forte até os dias de hoje. Enquanto uns dizem que uma grande festa acontece na misteriosa embarcação, outros garantem que não há sequer um tripulante no barco. Esses mistérios enriquecem a cultura da bacia do São Francisco e inspiram muitos artistas, músicos e contadores de história da região.
Da mesma forma, as populações ribeirinhas creem haver entidades habitando as florestas e as águas, espíritos ligados à natureza, que às vezes se materializam na superfície das matas e dos rios. Eles se revelam por meio do folclore que se repete de geração a geração, mantendo-se vivos no imaginário popular.
Onde e em que momento o elo desses seres com o rio São Francisco, o “velho Chico”, toca a ficção e a realidade?
O rio São Francisco é o nosso Nilo, também chamado de rio da integração nacional, uma vez que passa por vários Estados até chegar ao mar.
Nas últimas décadas ele vem passando por várias transformações provocadas pela mão do homem. A ação humana e a transposição das águas do rio causou morte e trouxe desequilíbrio ao ecossistema da região, afetando a vida das populações ribeirinhas, dos índios, dos animais.... e... dos espíritos da natureza.
A construção da hidrelétrica de Xingó, instalada no rio São Francisco entre os Estados de Alagoas e Sergipe, no município de Canindé de São Francisco, local onde Domingos Montagner se afogou, provocou sério impacto ambiental, de caráter irreversível.
A usina alterou a paisagem ocasionando grandes desmatamentos e prejuízos à fauna e flora. Áreas de floresta foram inundadas com o consequente desaparecimento do habitat de várias espécies de animais ameaçadas de extinção, como o sapo cururu. A temperatura da água mudou devido à geração de energia à qual muitos peixes não conseguiram se adaptar. Em razão de uma série de explosões durante a construção da hidrelétrica, o curso do rio foi alterado, montanhas foram escavadas, animais desapareceram, cascatas silenciaram, restingas e corredeiras sufocaram, gerando uma área de refluxo, redemoinhos e correntes anormais, na forma de um lamento silencioso e pedido de socorro do São Francisco.
O impacto da hidrelétrica afetou não apenas o meio ambiente, mas, também, as populações ribeirinhas, que tiveram que sair de suas margens.
Como já dito antes: a água do velho Chico é ancestral e sagrada...
A novela “Velho Chico” foi de encontro a isso. A história começa na década de 70, quando a Usina Hidrelétrica de Sobradinho foi construída, desalojando muitas famílias do seu entorno. O coronel Jacinto (Tarcísio Meira), acaba sendo o maior beneficiário dessa obra. Herdeiro da família de Sá Ribeiro, ocupou a região e fundou Grotas do São Francisco, incorporando às suas terras tantas outras quantas pôde alcançar: terras devolutas, indígenas, de quilombolas, usando para tanto seu prestígio político e a amizade com o cartorário da cidade. De todas as terras que desejou, a única que não conseguiu incorporar ao seu vasto latifúndio foi a Fazenda Piatã, uma pequena gleba que divide sua propriedade ao meio, herdada por seu inimigo, capitão Ernesto Rosa (Rodrigo Lombardi). A disputa da terra transcende a outras gerações, transformando a região num palco de guerra, violência e morte.
Tendo o rio São Francisco como pano de fundo, o que se vê no decorrer dos capítulos é uma família de latifundiários lidando com a terra e o rio de maneira tradicional e, outra, buscando formas alternativas de trabalhar a terra e de cuidar da água para encontrar o equilíbrio entre o homem, a natureza e as formas de produção, em meio à briga entre famílias, desencontros e mortes.
Talvez, o mais impressionante, seja saber que Domingos Montagner estava escalado para fazer outra novela. Ao conhecer o enredo de “Velho Chico”, ele se ofereceu para participar do elenco. É como se uma força o estivesse chamando... Talvez, estivesse...
O fato é que o plano da criação é verdadeiramente grandioso e, a compreensão desses aspectos desperta em nós uma reverência profunda ao Autor da vida.
Talvez o que melhor traduza este momento e todo o simbolismo por trás dele, seja a mensagem de despedida feita pelos índios que gravaram as cenas onde Santo, Domingos Montagner, ressuscitava:
"Por que estão querendo trazer a alma dele de volta? Ele nasceu de novo, hoje, se tornou um novo protetor do rio São Francisco, que estava tão esquecido, porque esse rio não pode morrer. A novela contou mistérios do rio e esse foi mais um desses. Mas ele se tornou um ser de luz, pois a água não tira a vida, dá a vida e fiquem felizes pela alma dele, pois quando ele entrou no rio, se despediu do corpo e da alma, nasceu em um mundo melhor. Algum dia, os brancos irão entender isso, então temos que fazer um ritual para que os brancos entendam que ele está bem, que ele, agora, é um protetor do rio São Francisco".
Nas Escrituras Sagradas, encontramos várias passagens falando da água: Jesus sendo batizado nas águas do Rio Jordão, como símbolo da vida nova e da purificação dos pecados; Moisés com o seu cajado abrindo as águas do Mar Vermelho para seguir com seu povo rumo à Terra Prometida....
Nas religiões afro-brasileiras, encontramos os orixás em perfeita harmonia com as águas e a natureza. Muitos dos seus rituais são realizados em cachoeiras, rios e mares.... Assim como, as comunidades ribeirinhas por onde o velho Chico passa, ricas, quando o assunto é cultura, tradição e lendas, tendo o rio como seu principal protagonista.
Quais são os mistérios das águas do rio São Francisco ao passar pelos capões esparsos entre os morros e as chapadas, pelo verde dos coqueiros e das palmeiras de buriti, e, o ecoar do grito das maritacas, que mexe com o nosso imaginário? Quais os segredos ocultos em suas margens e canions?
A verdade é que a natureza reluz nesse rio-mar em todo o seu esplendor, dominando com majestade o horizonte que lhe pertence. O caudaloso rio São Francisco tem uma beleza que impressiona, impõe respeito e uma espécie de veneração quase sagrada. É preciso ter cuidado para não se deixar hipnotizar, enredar e levar por suas correntes e redemoinhos.
Poucos lugares do mundo são tão identificados com a natureza quanto o velho Chico. Por que velho? Justamente por guardar a ancestralidade que corre em suas águas. Os índios dizem que não se deve entrar em suas margens ou em suas águas sem pedir licença aos pajés. A água do velho Chico é sagrada.
Nesta semana, no leito do rio São Francisco, lágrimas de todo um país se juntaram às de Irati.
Foi com estarrecimento que ficamos sabendo da morte por afogamento em suas águas, do carismático e talentoso ator Domingos Montagner, a duas semanas do último capítulo da novela, onde o velho Chico também é um dos protagonistas. Uma triste ironia!!!
A ficção e a realidade, a realidade e a ficção....
A novela escrita por Benedito Ruy Barbosa feita em homenagem ao rio São Francisco, num cenário que retrata a escassez da água, poluição e a transposição de um dos rios mais importantes do Brasil. Uma história centrada no amor e no ódio, na vida e na morte, tendo como fio condutor a saga do destemido Santo dos Anjos, o personagem de Domingos Montagner, um herói que comovia e transpirava afeto, hoje imortalizado nas águas do São Francisco, rio que com ele contracenou do início ao fim.
Nunca o nome de um personagem coube tão bem em uma história: Santo dos Anjos. Santo nos remete aos ritos sagrados, à divindade, ao sagrado que o rio representa; dos Anjos, anjos são mensageiros espirituais entre Deus e os homens, com os quais Domingos Montagner deve estar confraternizando agora.
Seguindo esse entendimento, é preciso dizer que a novela navegou por águas turvas e perigosas ao lidar com o misterioso mundo dos mortos: o barco dos mortos; o matador que consulta o espírito do pai morto; as famílias em luta em nome dos mortos; a vidente indígena que prevê a morte de alguém e dá uma carranca para proteção; o morto que fica vagando entre os vivos, por não saber que morreu; o espírito de uma criança morta aprisionado por anos em um dos quartos da casa do coronel; a confecção da mortalha à espera da morte; o retrato na parede do pai morto; a matriarca que mergulha no rio para morrer, após pressentir a morte do neto; o corpo inerte sendo levado pelo rio para renascer após a morte, justamente Santo, o personagem de Domingos Montagner, uma das cenas mais impactantes da novela... e... a própria morte do rio, mencionada o tempo todo... tendo como música tema de Santo e Tereza "Mortal Loucura" de Maria Bethânia.
Em seus capítulos, a novela transitou pela religião com matriz africana e indígena. Os atores foram envolvidos nessa trama, sem serem iniciados e protegidos das energias e forças da natureza que envolvem mistérios densos e delicados. A cultura afro-indígena tem os seus mistérios e, muitos deles precisam ser dominados e tratados com o máximo respeito. Como bem sabem os índios: é preciso pedir permissão para entrar nos rios e nas matas... Eles têm seus donos....
Existe energia na natureza. Existe um poder. Existe uma força. Existe vida. A ficção se apropriou das águas do São Francisco, ao ponto de se tornarem um só, sem olhar para os perigos dessa proximidade.
Domingos Montagner foi o segundo ator a morrer durante a gravação da novela. O primeiro foi o não menos talentoso, Umberto Magnani, cujo personagem era um padre, um religioso, conhecedor dos mistérios da vida e da morte.
As vivencias dos índios e dos pescadores do rio São Francisco transcendem a atividade da pesca tocando o imaginário simbólico. A vida pulsa não apenas nos aspectos que envolvem a alimentação, a economia e o transporte da região, mas também a cultura local, com muitas lendas e histórias. Uma das histórias contadas pelos barranqueiros é a do "Vapor Encantado", transportado para a novela “Velho Chico” como a "Gaiola Encantada", o barco dos mortos.
A embarcação teria sido avistada pela primeira vez por dois canoeiros. Eles estariam atravessando o rio quando se depararam com um barco a vapor muito iluminado navegando ao longe. Ao se aproximarem, o barco simplesmente desapareceu diante deles.
Essa lenda segue forte até os dias de hoje. Enquanto uns dizem que uma grande festa acontece na misteriosa embarcação, outros garantem que não há sequer um tripulante no barco. Esses mistérios enriquecem a cultura da bacia do São Francisco e inspiram muitos artistas, músicos e contadores de história da região.
Da mesma forma, as populações ribeirinhas creem haver entidades habitando as florestas e as águas, espíritos ligados à natureza, que às vezes se materializam na superfície das matas e dos rios. Eles se revelam por meio do folclore que se repete de geração a geração, mantendo-se vivos no imaginário popular.
Onde e em que momento o elo desses seres com o rio São Francisco, o “velho Chico”, toca a ficção e a realidade?
O rio São Francisco é o nosso Nilo, também chamado de rio da integração nacional, uma vez que passa por vários Estados até chegar ao mar.
Nas últimas décadas ele vem passando por várias transformações provocadas pela mão do homem. A ação humana e a transposição das águas do rio causou morte e trouxe desequilíbrio ao ecossistema da região, afetando a vida das populações ribeirinhas, dos índios, dos animais.... e... dos espíritos da natureza.
A construção da hidrelétrica de Xingó, instalada no rio São Francisco entre os Estados de Alagoas e Sergipe, no município de Canindé de São Francisco, local onde Domingos Montagner se afogou, provocou sério impacto ambiental, de caráter irreversível.
A usina alterou a paisagem ocasionando grandes desmatamentos e prejuízos à fauna e flora. Áreas de floresta foram inundadas com o consequente desaparecimento do habitat de várias espécies de animais ameaçadas de extinção, como o sapo cururu. A temperatura da água mudou devido à geração de energia à qual muitos peixes não conseguiram se adaptar. Em razão de uma série de explosões durante a construção da hidrelétrica, o curso do rio foi alterado, montanhas foram escavadas, animais desapareceram, cascatas silenciaram, restingas e corredeiras sufocaram, gerando uma área de refluxo, redemoinhos e correntes anormais, na forma de um lamento silencioso e pedido de socorro do São Francisco.
O impacto da hidrelétrica afetou não apenas o meio ambiente, mas, também, as populações ribeirinhas, que tiveram que sair de suas margens.
Como já dito antes: a água do velho Chico é ancestral e sagrada...
A novela “Velho Chico” foi de encontro a isso. A história começa na década de 70, quando a Usina Hidrelétrica de Sobradinho foi construída, desalojando muitas famílias do seu entorno. O coronel Jacinto (Tarcísio Meira), acaba sendo o maior beneficiário dessa obra. Herdeiro da família de Sá Ribeiro, ocupou a região e fundou Grotas do São Francisco, incorporando às suas terras tantas outras quantas pôde alcançar: terras devolutas, indígenas, de quilombolas, usando para tanto seu prestígio político e a amizade com o cartorário da cidade. De todas as terras que desejou, a única que não conseguiu incorporar ao seu vasto latifúndio foi a Fazenda Piatã, uma pequena gleba que divide sua propriedade ao meio, herdada por seu inimigo, capitão Ernesto Rosa (Rodrigo Lombardi). A disputa da terra transcende a outras gerações, transformando a região num palco de guerra, violência e morte.
Tendo o rio São Francisco como pano de fundo, o que se vê no decorrer dos capítulos é uma família de latifundiários lidando com a terra e o rio de maneira tradicional e, outra, buscando formas alternativas de trabalhar a terra e de cuidar da água para encontrar o equilíbrio entre o homem, a natureza e as formas de produção, em meio à briga entre famílias, desencontros e mortes.
Talvez, o mais impressionante, seja saber que Domingos Montagner estava escalado para fazer outra novela. Ao conhecer o enredo de “Velho Chico”, ele se ofereceu para participar do elenco. É como se uma força o estivesse chamando... Talvez, estivesse...
O fato é que o plano da criação é verdadeiramente grandioso e, a compreensão desses aspectos desperta em nós uma reverência profunda ao Autor da vida.
Talvez o que melhor traduza este momento e todo o simbolismo por trás dele, seja a mensagem de despedida feita pelos índios que gravaram as cenas onde Santo, Domingos Montagner, ressuscitava:
"Por que estão querendo trazer a alma dele de volta? Ele nasceu de novo, hoje, se tornou um novo protetor do rio São Francisco, que estava tão esquecido, porque esse rio não pode morrer. A novela contou mistérios do rio e esse foi mais um desses. Mas ele se tornou um ser de luz, pois a água não tira a vida, dá a vida e fiquem felizes pela alma dele, pois quando ele entrou no rio, se despediu do corpo e da alma, nasceu em um mundo melhor. Algum dia, os brancos irão entender isso, então temos que fazer um ritual para que os brancos entendam que ele está bem, que ele, agora, é um protetor do rio São Francisco".
Minha fé é no desconhecido, em tudo que não podemos compreender por meio da razão. Creio que o que está acima do nosso entendimento é apenas um fato em outras dimensões e que no reino do desconhecido há uma infinita reserva de poder..... Siga em paz, Domingos Montagner...
Shadow/Mariasun Montañés