domingo, 19 de fevereiro de 2017





O PAÍS DO CARNAVAL É HOJE O PAÍS DA CANA



O Carnaval é considerado por muitos o ópio do povo brasileiro. Quatro dias de folia feitos a medida para as pessoas esquecerem das dores, das mazelas da política e da sua nada mole vida. O entorpecimento tão desejado pelos políticos, avaliam sociólogos, antropólogos e estudiosos.

Ok. Mas qual é o problema das pessoas se desprenderem da dura e áspera realidade por alguns dias para fazer o que bem entenderem? Caírem na folia, descansarem ou meditarem?

Sim, o Brasil é resultado do obscurantismo. Isso a gente já sabe. Mas também é certo que o Carnaval, o BBB ou o futebol, não têm a menor culpa. A escuridão ou a luz dependem da consciência e do coração de cada um, entorpecido ou não pelo lume das falsas promessas e fantasias de uma sociedade “ideal”, condenada à miséria e à ignorância.

A história não é estanque, e nós também não somos graças a Deus! Ela anda e se modifica, e faz as pessoas andarem e se modificarem com ela.

A pirotecnia das escolas de samba do Rio, custeadas pelo crime organizado e a contravenção, por muito tempo foram o símbolo do nosso Carnaval. Varava-se a noite até o amanhecer para ver a última escola desfilar na avenida, anotando e avaliando num pedacinho de papel: harmonia, evolução, bateria, alegorias... até  o dia da apuração chegar, com a torcida sempre fiel para a escola do coração ser a campeã.

Porém, o que deveria ser do povo e para o povo, foi perdendo a sua raiz. É difícil analisar um processo de transformação tão rápido quanto o que transformou um espetáculo popular tão grandioso em um espetáculo midiático produzido para encantar o mundo e os estrangeiros. O charme de escolas tradicionais como a Mangueira e a Portela (ah... minha Portela, quando vi você passar...) foi perdendo o brilho, a espontaneidade, sua tradição e até as suas cores.

Aliás, depois que em 2015, quando o enredo da Beija Flor sobre a Guiné Equatorial, ditadura sanguinária apoiada pelo PT, sagrou-se campeã, ficou muito claro que os desfiles das escolas não representam mais o Carnaval brasileiro. Foi um espetáculo vergonhoso perante o mundo!!! O Carnaval da corrupção e da degradação do samba, uma mancha na história dos carnavais cariocas.

Hoje, os blocos carnavalescos de rua reinam soberanos, multiplicando-se pelas principais capitais e cidades do interior, resgatando a alegria e a folia popular.

A Lava Jato e as redes sociais estão aí, expondo feridas, mentiras, escândalos, corrupção, inconformismo, impunidade num batucar diário sem fim. É quando a realidade desafina e revela toda a sua crueza, mais para a dramaticidade de um tango de Gardel do que para a malevolência de um samba de Noel.

Há muito tempo não se via as pessoas tão desanimadas e descrentes neste país, destilando ódio pelas ventas e uma insatisfação incontida na net, sendo que a brasilidade do brasileiro sempre foi o riso aberto e a irreverência.

E aqui não me refiro a um riso que cega ou a uma irreverência que aliena. Não.

De um jeito sofisticado e perspicaz, o brasileiro consegue tirar sarro, rir de si mesmo, fazer piada e encontrar inspiração na dura realidade e nos sonhos roubados. 

Carnaval hoje rima com impeachment, bandido, desonestidade, impunidade, Luladrão que já é uma rima de corrupção, tudo ali, nas esquinas e em qualquer lugar. O sofrimento nacional marca cada estrofe das marchinhas.

 “Tanto riso ó quanta alegria, mais de mil palhaços no salão”...

O Carnaval mudou. Os palhaços continuam no salão, mas a alegria, ah... essa foi se transformando em ironia cáustica.

No ano passado, nada de arlequins ou colombinas, mas, o japonês da Federal com direito até a um hit que tomou as ruas do país:

“Ih, me dei mal, bateu à minha porta o japonês da Federal”!...

A folia de Momo hoje abre alas para os blocos de rua, com seu componente crítico. A diversão deixou de ser banal para ser catarse. O espírito verde-amarelo se apresenta salpicado de confete e serpentina. Algo que só o brasileiro sabe fazer com deboche e bom humor.

Os pensadores e intelectuais da objetividade, esses ainda acreditam que o Carnaval das lágrimas dos pierrôs, é o ópio do povo. Fazer o quê? Para entender o reinado de Momo é preciso acompanhar a história.

Não tem jeito. O brasileiro tem alma de folião. Por mais que batam à sua porta para lembrá-lo da Quarta-feira de Cinzas e do futuro incerto, ele até poderá, com um ar blasé, fingir que concorda, mas depois irá cair na folia. 

Portanto, é chegada a hora de vestir o short e a camiseta, desligar o computador e colocar o pé na rua ao som das marchinhas. E que marchinhas!!!

Este ano a marchinha que começa a emplacar é a da “CANA”. Não, não aquela cana que é usada para fazer açúcar, mas aquela que representa o lugar onde alguns já estão e outros em breve estarão (se a deusa da Justiça assim o permitir) com uniforme listrado, vendo o sol nascer quadrado:




“É cana pra cá é cana pra lá,
a cana tá moda, mas é bom não enganar;
tem gente poderosa, com fama de bacana,
que vai perder a pose quando entrar em cana...”


Um ótimo CARNAVAL a todos, juízo e.... para quem gosta: boa folia; para quem não gosta: bom descanso!!! 



Shadow/Mariasun Montañés


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