quinta-feira, 5 de agosto de 2010




ROTEIRO DE VIAGEM DE UM PAI




Quando era criança, Valquíria costumava esperar com
ansiedade pelas férias, pensando na viagem que todos fariam. No dia programado, muito antes do sol raiar, ela e a Leninha acordavam alvoroçadas e tagarelando. Enquanto Dna. Rosa preparava o café, o Seu Armando ia colocando e ajeitando a bagagem no carro.

À medida que o Fusquinha pegava a estrada, e durante o caminho, Val ia imaginando como seria o lugar para onde aquelas curvas e retas os levaria, as novidades que estariam reservadas, as experiências pelas quais passaria, os novos amigos que faria. Tudo era mágico e belo, apesar das longas horas de viagem, do farelo de bolacha que teimava em se espalhar pelo carro, do congestionamento que retardava a chegada, de ter que dividir o banco de trás com a Lena, o cachorro e a bagagem.

Não havia nada que pudesse tirar a alegria daqueles dias. Aliás, no fundo, sua maior felicidade era poder passar mais tempo com o Seu Armando, seu pai. Ele era um homem admirável e especial, profundo conhecedor da alma humana, caridoso, companheiro da mulher e amigo das filhas; tinha o ouvido apurado (nada lhe escapava), com um simples olhar era capaz de aplacar a dor e serenar os ânimos; não desperdiçava as palavras, usava-as quase sempre com sabedoria; tinha grande habilidade com as mãos, era comum vê-lo nos finais de semana, talhando brinquedos para as filhas (um cavalinho, um soldadinho de chumbo, uma cadeirinha de balanço,...), além de ser o melhor contador de histórias que qualquer criança poderia ter. Graças a ele, Val e Leninha, puderam conhecer também o mundo fantástico das fadas, duendes, príncipes e princesas, anjos, cheiros, sons, palavras, mistérios, onde a imaginação se perdia.

E as viagens então?

Ah, como ele gostava de dar aqueles passeios para a família! Ficava meses e meses planejando as férias, parecia que trabalhava o ano inteiro para economizar dinheiro e poder presenteá-las com eles.


Cada ano era para um lugar diferente. Foi assim que a Val e a Leninha conheceram cidades históricas e parte da História do Brasil, lugares pitorescos do norte ao sul do país, praias das mais variadas, recantos escondidos entre as montanhas, aprenderam a fazer amigos e a se doar, como o seu pai se doava a elas.

Era danado ele! Hoje não tem como não associar essas viagens a cada uma das etapas da vida delas. É só pensar num lugar, e lá vem a recordação daqueles dias e da figura emblemática de Seu Armando.

Ainda é bem viva na memória da Val a viagem feita a Camboriú, o sofrimento, o choro e a contrariedade ao entrar no carro, por estar deixando o namorado com quem havia brigado no dia anterior. "Por quê todo mundo tem sempre que ir pro mesmo lugar feito arrastão?", se questionava. Durante todo o trajeto permaneceu de óculos escuros, soluçando baixinho, pra ninguém perceber. Esforço desperdiçado, diga-se de passagem, pois até um cego seria capaz de notar a desolação e agitação que se apossavam dela.

Hoje sorri ao lembrar de tudo disso. "Como eu era boba naquela época!". Afinal, não fosse aquela viagem, não teria conhecido no teleférico, indo para a Praia das Laranjeiras, o Rubinho, com quem acabou casando anos mais tarde, e que lhe deu a Bia, tornando o Seu Armando, avô. É como se seu pai tivesse conspirado uma vida inteira para que fosse assim! Não poderia haver lugar mais perfeito e romântico para um primeiro encontro, lá no alto, tendo ao fundo as encostas verdes rodeadas por um mar azul de águas mansas e tranquilas.

Aliás, essa foi uma das últimas viagens que fez com o pai. Já na Universidade e com o namoro engatilhado, não tardou a começar viajar com a turma, deixando para trás os passeios em família.

Foi assim, entre uma viagem e outra, que Seu Armando viu as filhas se tornarem senhoras do próprio destino. Enquanto teve tempo e saúde, soube proporcionar à Bia, sua neta, filha da Val, alguns mágicos e inesquecíveis passeios também.

Para a Val, nunca mais haverá férias tão boas.
Poderão vir até outras melhores, mas jamais será a mesma coisa. O tempo parece ter permanecido estanque para eternizar-se naqueles dias.

"Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata". (Carlos Drummond de Andrade)



"Sábio é o pai que conhece o próprio filho".
(William Shakespeare)




A todos os Amigos deste Cantinho

aquele que é pai

aquela que é pãe

aquele que tem o pai ao seu lado ou no coração,


UM FELIZ DIA DOS PAIS!!!

Shadow


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