A PÁSCOA DE CHOCOLATE
Coelhinho da Páscoa
Que trazes pra mim?
Que trazes pra mim?
Um ovo, dois ovos, três ovos assim...
Mais um ano coelhos
risonhos e ovos de chocolate anunciam que a Páscoa se aproxima. Leninha caminha
pelo corredor do supermercado forrado e abarrotado de ovos de todos os preços e
tamanhos. Entre as opções: crocante, amargo, ao leite, branco, trufado,
com ou sem recheio. No quesito variedade, tem para todos os gostos, num apelo
em alto e bom tom: “Leve o seu! Se não pegar, pode ficar sem, hein!” “Vai
ficar passando vontade?” “Uma Páscoa sem ovo de chocolate, não é Páscoa!”. Se uma criança estiver ao seu lado, então, com aqueles
olhinhos brilhantes e pidões, você acabará levando no mínimo um, apesar de sua
voz interior dizer: “Mas tá muito caro!”.
Enquanto percorre aquele espaço repleto de
tentações, Leninha relembra do Tio Zuzu comentando na Páscoa passada: Será que
estamos comemorando a Páscoa em família sem perder aquilo que ela representa?
Será que temos passado para as crianças a tradição de comemorar a vida ou os
ovos são o mais importante da festa?
Leninha
ainda guarda belas e ternas recordações dos emblemáticos encontros em família
em São Pedro, onde nem só de chocolate e coelhos se fazia a Páscoa. A procissão no Domingo
de Ramos pelas ruas da cidade e a emoção no Sábado de Aleluia, com as crianças
caminhando em direção à Igreja Matriz com velas acessas. Era um momento muito
aguardado por quem ali estivesse. Em sua imaginação anjos se juntavam a todos, entoando hinos de
Glória e Louvor pelo Cristo Ressuscitado. Era um ritual emocionante de fé e esperança,
que tocava o coração sem fazer distinção entre crianças, jovens e adultos.
A reunião
da família para celebrar a Páscoa, não era apenas a caça dos primos e sobrinhos aos ovinhos
de chocolate espalhados pelo jardim da pequena chácara; mas, a celebração da
vida e do encontro entre todos; afetos compartilhados ao longo de mais um ano,
ao redor da mesa em torno da bacalhoada servida no almoço de domingo, hummmm... É verdade que a troca de ovos de chocolates sempre fez parte da festa,
mas a magia em torno da celebração era, sem dúvida, muito mais importante e impactante
para as crianças, do que os ovos de chocolate em si.
A
promessa e expectativa na eternidade, da continuidade da vida... estava ali, representada
naquela mesa...
Hoje, as
crianças e os adultos parecem ver apenas o coelhinho e os ovos de chocolates,
sem se importar, inclusive com o preço. Paga-se o equivalente a cinco barras de
chocolate ou mais, apenas pelo prazer de degustar o chocolate em forma de ovo. O
convite ao consumo que chegou ao Natal e ao Dia das Mães, agora também faz
parte da Páscoa.
O gosto chega a
ser amargo e pouco saboroso quando se pensa no diferencial de preços dos
cobiçados ovos se comparados aos das barras de chocolate. É preciso preparar o
bolso para gastar bem mais. Leninha não consegue entender como um ovinho de 320
gramas custa R$ 37,63, enquanto o mesmo chocolate em barras de 150g custa R$ 4,44. Afinal, qual a diferença? Chocolate é
chocolate e cacau é cacau, não importa se oval ou retangular!!!
Onde está o
espírito da Páscoa daqueles que se aproveitam da data para aumentar os lucros e
faturar com o preço dos ovos de chocolate?
Vendo o congestionamento
e empurra-empurra no corredor daquelas delícias suspensas em formato de ovo,
Leninha se perguntava: - Por que não levar barras de chocolate então, que estão
no corredor ao lado?
É simples Leninha: Porque a tradição e o desejo prevalecem
sobre a lógica e o bolso. As pessoas acreditam que irão desapontar umas às
outras se derem barras de chocolate ao invés do tão esperado ovo da Cacau Show;
que o sorriso e o brilho nos olhos das crianças desaparecerão.
Será?
Existe um prazer
hipnótico e insensato, que dificulta resistir à tentação de levar um ovo de
chocolate para o filho outro para o afilhado e um para você (porque afinal a
Páscoa é de todos), mesmo que depois se tenha de abrir a carteira e pagar cinco
vezes ou mais.
E de nada
adianta ir para as redes sociais lamentar e reclamar de que se sentiu lesado e assaltado
pelo preço que pagou. Não, a escolha foi sua. A barra e o ovo de chocolate não
satisfazem o mesmo desejo, que é unicamente seu. Aceita, que dói menos!
Nem tudo que
fazemos obedece à lógica, ao bom senso e ao bolso. Ficar sem o ovo ou
substituí-lo por barras de chocolate, para muitos, é pior do que ficar sem ele
e com o dinheiro no bolso, ou, com o seu valor equivalente em barras de
chocolate. O ovo tem um valor agregado, que remete à memória emocional e ao
desejo de cada um. O comerciante sabe disso, e é justamente isso, o que
determina e mantém os preços.
- Não!, disse
Leninha para si mesma. Este ano vai ser diferente!
Lembra como se
fosse ontem, que por ocasião da Páscoa, sua mãe costumava fazer ovos em
forminhas de 250g, para presentear as crianças da família e aos amigos; forminhas, que Leninha
cuidadosamente ajudava a preencher para não vazar e, depois, a embrulhar os ovos com todo
o esmero e atenção em papel alumínio e celofane colorido. Eram tão delicados e bem feitos, que sua mãe começou a receber
pequenas encomendas da vizinhança, das mães de seus coleguinhas da escola e até
do Seu Bastião do mercadinho da esquina. Sem dúvida, aqueles ovinhos artesanais
tinham um sabor diferente, eram feitos de amor.
Movida por esse
espírito, decidiu que não seria explorada. Não este ano! Sem pensar duas vezes,
comprou algumas forminhas, barras de chocolate, creme de leite, chocolate granulado, papel
celofane e fitas coloridas.
Enquanto picava
o chocolate em pequenos pedaços para levá-los ao micro ondas, começou a
questionar:
E se ficarem feios? E se pensarem que eu não
dei muito valor ao presente dos sobrinhos? Foi o que bastou para se imaginar destruindo a Páscoa
da família.
No seu inconsciente estava presente a razão das
pessoas se acotovelarem em um corredor estreito para conseguir um chocolate não
apenas em forma de ovo, mas de marca, posteriormente, eternizado como um troféu em fotos postadas
no Instagram e no Facebook.
Ah... o medo e receio de fugir à regra, do lugar comum, do
socialmente esperado...
Leninha, então, ouviu uma voz interior, que a fez se animar e
lembrar de sua mãe: Teus ovos serão mais apreciados que os de qualquer marca
ou crocância, porque terão o teu toque, a tua pitadinha de amor e carinho. Isso
os torna únicos e extremamente saborosos. O resto é apenas uma convenção
desnecessária e cara. Não se esqueça: O que vale é a comemoração e a lição
espiritual da data feita com alegria e doçura.
Foi assim, e ao se lembrar das Páscoas de sua
infância e de sua mãe, que ela sorriu e continuou a derreter o chocolate, dispondo-se a fazer os mais deliciosos ovos do planeta.
É... ao que parece, para Leninha, esta Páscoa será
diferente das outras. Já colocou em uma cestinha, com todo zelo e cuidado, alguns
ovinhos embrulhados no maior capricho em papel alumínio e celofane arrematados com um lindo
laçarote colorido, tal como fazia quando era menina.
Dentro de cada um, além do seu amor e
do ovo tradicional, ovos recheados e trufados. Certamente, serão a sensação no próximo
domingo.
...Coelhinho da Páscoa
Que cor eles têm?
Que cor eles têm?
Azul, amarelo, vermelho também...
Desejo
que nesta Páscoa, além do coelhinho e ovos de chocolate, você consiga pensar no
verdadeiro sentido e significado desta data: O mistério da Ressurreição e da
vida eterna!!!
FELIZ
PÁSCOA!!!
O trabalho A PÁSCOA DE CHOCOLATE de MARIASUN MONTAÑÉS está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
Shadow/Mariasun Montañés